Inovação

Como é que é este paradigma alternativo dos Mini-Ciclos de Leccionamento?

   Anteriormente, na Contestação, foram explicitadas algumas das falhas do actual sistema de ensino. Com base nelas, poder-se-á concluir que é necessário um sistema de ensino que garanta maior flexibilidade nas aprendizagens e que seja mais focado na transmissão de conhecimentos e menos na pseudo-aferição pseudo-exacta dos pseudo-conhecimentos pseudo-adquiridos pelos alunos (pedimos desculpa aos leitores pela utilização exagerada do prefixo “pseudo-”), e mais estimulador do interesse dos alunos. Ora, nenhuma solução é, em absoluto, ideal, mas que não seja porque há sempre falhas na execução de qualquer empreendimento humano, pelo que não se terá a arrogância de afirmar que a solução aqui apresentada é perfeita; longe disso, há sempre a possibilidade de se melhorar, e contamos com o eventual feedback dos leitores para conseguir isso mesmo. Mas, de qualquer das formas, por nos parecer (mesmo tendo em conta que esta hipótese não surgiu propriamente de um amplo domínio da pedagogia, mas mais da experiência prática, de quem lida diariamente com o ensino na sua faceta principal – a do utilizador final, que é o mesmo que dizer do aluno) que este sistema de ensino alternativo seria, de facto, mais desejável do que o actual, não nos podemos coibir de apresentar aqui esta proposta.

   Comecemos pelo início: o nome. Como, por agora, talvez já saibam, esta proposta de sistema de ensino alternativo foi denominada Mini-Ciclos de Leccionamento, termo que é, ou que esperamos que seja, simultaneamente suficientemente simples para ser recordado e suficientemente descritivo para identificar, logo à partida, o traço distintivo deste novo sistema de ensino. Que é, precisamente, a existência de mini-ciclos de leccionamento: em vez de termos um grande conjunto de matéria a ser leccionada ao longo de um grande período de tempo (um ano ou um semestre), o que corresponderia a um macro-ciclo de leccionamento, teremos uma matéria individual (ou uma associação reduzida de matérias) a ser(em) leccionada(s) durante um curto período de tempo (proporíamos, de uma forma bastante estimada, cerca de duas a dez aulas), originando, assim, um mini-ciclo de leccionamento.

   Mas isto, por si só, é bastante vago e tem pouca substância para caracterizar adequadamente este sistema de ensino. Falta um outro aspecto essencial, que é aquilo que, por falta de melhor termo, se designou Árvore do Conhecimento. E o que é, então, esta “árvore do conhecimento”? Não, não se trata de nenhuma planta com propriedades místicas ou metafísicas, por mais decepcionante que esta afirmação possa ser, mas sim de um diagrama (por agora, ainda não propriamente delineado, principalmente porque dirá respeito a todos os conhecimentos humanos, razão por que serão necessários os esforços conjuntos de um grupo bastante amplo de especialistas nas mais diversas áreas para o elaborar com maior precisão; não havendo, por agora, a possibilidade de se reunir um tal grupo, ainda não se pôde, para grande desprazer nosso, delinear com todo o pormenor esse diagrama, embora, como mais à frente se referirá, se possa já elaborar a modos que um esboço) onde se disporiam os vários mini-ciclos de leccionamento (a que, convém referi-lo, também se poderia chamar, sem grandes distorções de sentidos, “módulos”, tornando este diagrama a “árvore dos módulos”), de acordo com as suas inter-dependências e inter-relações. Passemos a elaborar.

   Se formos a observar atentamente as idiossincrasias do conhecimento humano (não apenas o científico, mas todo ele, seja prático, teórico ou qualquer outra coisa entre estas…), não teremos grandes dificuldades em observar que este não é propriamente uma coisa estanque, fechada, claramente segmentada; em vez disso, verifica-se que as áreas a modos que se diluem umas nas outras, havendo certas regiões onde se hesita bastante em atribuir os conhecimentos a uma dada disciplina ou área do saber em detrimento de outra. Semelhantemente, também se verifica que há um certo encadeamento no conhecimento, havendo conhecimentos mais… básicos, à falta de melhor termo, e outros mais avançados, que exigem conhecimento prévio dos primeiros para poderem ser totalmente compreendidos e apreendidos. Ora, tendo tudo isto em conta, e de modo a tornar a aprendizagem mais fácil e natural (e, inerentemente, mais interessante), fará sentido dispor os conhecimentos de tal forma que só se pudesse adquirir os avançados depois de adquirir os básicos, salvaguardando-se os casos em que faria sentido chegar a um determinado conhecimento por vias diferentes (por exemplo, fará sentido chegar ao estudo do funcionamento dos músculos quer pela via da Biologia Celular, quer pela via da Anatomia, quer pela via da Actividade Física, entre possíveis outras). É, pois, esta disposição que origina esta árvore do conhecimento. O epíteto “árvore” provém do facto de se poder, falando muito genericamente, encontrar três grandes zonas neste diagrama, a que, por uma analogia com o mundo vegetal, poderemos chamar raiz, caule e ramos, como descreveremos de seguida.

   A raiz corresponde exactamente ao tipo de conhecimentos mais básicos, que são essenciais para compreender todos os outros. Obviamente, incidirá, sobretudo, sobre o sistema de escrita e numerais adoptados na região em causa (em Portugal, será, portanto, o alfabeto latino e os numerais arábicos – tecnicamente importados da Índia, mas isso é outra história…), bem como pelos rudimentos, ou melhor, pelas partes mais práticas do uso da linguagem (não tanto pela via da Gramática, mas mais pelo vocabulário e afins). Assim, de um modo geral, a raiz corresponderia a uma versão bastante reduzida do actual 1.º ciclo.

   No caule, há um conjunto um pouco mais restrito de conhecimentos, de certa forma o nível introdutório dos conhecimentos futuros, sendo transmitidas as bases da Matemática (possivelmente também da Lógica, que, mesmo estando um pouco à parte desta, acaba por estar bastante relacionada com ela), do funcionamento do Universo (estimulando já a percepção do mundo de uma perspectiva científica, talvez envolvendo já a explicitação das formas mais simplificadas da teoria atómica e, se possível, talvez até da teoria quântica, servindo de base a tudo quanto se relacione com o que agora se chama Física e Química) e dos seres vivos (correspondendo a uma iniciação à Biologia), das diversas formas de conhecimento prático (de áreas tão diversas e dispersas como sejam a Culinária, a Mecânica, a Electrónica…), do estudo da História e cultura humanas (correspondentes, então, a muito do que hoje se considera pertencer ao âmbito das Humanidades: Geografia, Sociologia, Antropologia, a própria História…), entre possivelmente muitas outras. Talvez também se incluiria aqui o estudo das linguagens, já não tanto pela perspectiva prática e utilitária da raiz, mas sim por uma mais científica, englobando já os diversos aspectos da linguística, eventualmente tendo em conta as várias famílias de linguagens (ou seja, talvez se pudesse progredir pelas diversas famílias linguísticas, como sejam, por exemplo, as línguas latinas, por sua vez englobadas no grupo das indo-europeias). O caule corresponderá, portanto, a algum tipo de amálgama do 1.º, 2.º e 3.º ciclos.

   Por fim, nos ramos, teríamos, de facto, a imensidão do conhecimento humano, disposta de acordo com o emaranhado de inter-dependências que se estabelecem (claro, a raiz e o caule também apresentariam este tipo de organização, mas é nos ramos que se torna mais notória, daí que seja aqui que se está a destacar esse pormenor), da Astronomia à Zoologia, da prática à teoria. Englobariam, portanto, grande parte do que é hoje o 3.º ciclo e a totalidade do ensino secundário e do ensino superior.

   É digno de se frisar que estas divisões não são rígidas, antes correspondendo a regiões mais ou menos delimitadas por terem características semelhantes; nesse mesmo sentido, as referências a disciplinas e áreas do saber e a actuais divisões do sistema de ensino surgem não porque se verifique a sua ocorrência ao abrigo deste paradigma alternativo de ensino, mas sim para melhor contextualização comparativamente ao que hoje em dia se passa. Adicionalmente, convém destacar que, idealmente, este conhecimento corresponderia a raciocínios, por oposição à “informação em bruto”: convém saber o que é a tabuada do 7 e a que corresponde a multiplicação de 7 por mais um número (adicionar 7 ao número original), mas pouco contribuirá para o conhecimento, para o verdadeiro conhecimento, dos alunos obrigá-los a saber de cor e salteado que corresponde a 7, 14, 21, 28, 35, 42, 49, 56, 63 e 70. É certo que há certas coisas que se torna necessário saber de cor (fórmulas, axiomas, teoremas, leis e afins), mas é diferente pedir-se que se saiba que a área do círculo é dada por πr² ou que se saiba de cor os primeiros cem dígitos de π…

   Então, depois desta explanação, sabemos já que este sistema de ensino tem por base a divisão do conhecimento humano em mini-ciclos de leccionamento, que se organizam na árvore do conhecimento. Faltará referir, ainda, um outro aspecto organizacional que, à partida, convém deixar bem claro (sobretudo para aqueles cujo pensamento ainda esteja fortemente influenciado pelos moldes do actual sistema de ensino, que tem em muita conta este aspecto): a forma de garantir que os alunos adquiriram, de facto, os conhecimentos transmitidos, algo praticamente inevitável tendo em conta a falibilidade humana (no sentido em que os professores poderão falhar no seu propósito de ensinar e os alunos, no seu propósito de aprender). Conforme já se afirmou na Contestação, os instrumentos de avaliação actualmente utilizados não são os mais indicados, pelo que também teremos de inovar aqui (e é para isso que aqui estamos!).

   Idealmente, e entrando no âmbito da ficção científica, se os leitores assim o permitem, recorrer-se-ia a um qualquer tipo de equipamento que pudesse, pela análise das vias neurais do aluno, garantir que a informação correspondente aos conhecimentos leccionados foi adicionada à memória de longo prazo, mas, como isto ainda não é tecnicamente possível (e, num certo sentido, cientificamente possível), teremos de recorrer a uma solução um pouco mais convencional, nomeadamente à realização de exercícios respectivos à matéria em causa (esta realização tomaria lugar na escola, para minimizar eventuais fraudes ou falsificações diversas, mas não teria, de modo algum, os contornos de um teste; os exercícios seriam efectuados normalmente, naturalmente, à medida que o professor fosse explanando a matéria, sem qualquer tipo de pressão ou formalidade). Nesse sentido, quando um aluno demonstrasse que, consistentemente, conseguia realizar os exercícios sem erros de raciocínio (se possível, perdoar-se-iam más leituras de valores, trocas inadvertidas de sinais e outras distracções semelhantes), teria adquirido o conhecimento; ou, por outro lado, falando-se de conhecimentos mais práticos, se conseguisse desempenhar as tarefas leccionadas sem falhas, teria, então, adquirido os conhecimentos. Isto, embora possa ser visto como bastante semelhante aos testes do actual sistema de ensino, tem a dupla vantagem de incidir sobre um só conhecimento (aferindo-se o conhecimento mini-ciclo a mini-ciclo) e de ser efectuado ao longo do leccionamento dos conhecimentos, sem stresses nem inevitabilidades, permitindo, ainda, ao professor explicar melhor a matéria aos que não a entenderem, não por causa do teste ou do exame, mas sim precisamente para permitir que a adquiram. Além disto tudo, esta “avaliação” (se bem que este termo seja pouco apropriado para o que verdadeiramente é… talvez seja melhor “verificação”) não estaria condicionada às escalas de hoje em dia, sendo, em vez disso, a modos que binária: ou o aluno sabe, de facto, a matéria, e então pode progredir, ou não sabe e não poderá progredir (isto, claro, em relação aos outros mini-ciclos a que o mini-ciclo em causa serve de base…).

   Só que, no seguimento disto, teremos de incluir mais um aspecto que, embora não seja absolutamente indispensável para a exequibilidade deste sistema de ensino, será, ainda, bastante importante para que possa decorrer de uma forma (ainda) mais simples e directa, sobretudo no que toca aos conhecimentos teóricos. A questão é esta: seria uma grande perda de tempo se o professor tivesse de corrigir os exercícios de cada aluno, um a um e individualmente; simultaneamente, o módico de desonestidade que nunca poderemos excluir de qualquer ser humano leva a que se torne pouco praticável deixar que sejam os alunos a verificar se acertaram ou não (porque isso poderia influir na sua passagem e, por menos perdas de tempo que repetir um mini-ciclo em particular possa constituir, há sempre quem não tenha problemas em falsificar as coisas de modo a poder passar sem se incomodar minimamente em aprender – o que, convenhamos, também não deveria ser um incómodo, mas pronto…). Nesse sentido, a solução mais elegante e prática seria criar-se uma plataforma on-line, onde se poderia aceder aos exercícios e realizá-los, idealmente a partir de um qualquer tipo de tablet (possivelmente disponibilizado na escola a um preço reduzido, à semelhança de como em tempos ocorreu relativamente a computadores portáteis) que tivesse um ecrã táctil suficientemente preciso para permitir o uso de uma superfície de contacto suficientemente reduzida para se assemelhar ao material de escrita “analógico” (de modo a não se perder totalmente a questão da caligrafia, capacidade afinal útil para as situações em que não se tem equipamentos electrónicos à disposição e que fará sentido desenvolver e estimular), reconhecendo, então, o input caligráfico (os leitores que perdoem o termo estranho e muito provavelmente pouco técnico) e verificando quase instantaneamente a validade da resolução do exercício, associando logo de seguida a informação resultante dessa verificação ao aluno em causa. Claro, para minimizar as possibilidades de se efectuar uma cópia da resolução de outros sites criados apenas para se demonstrar que se sabe quando não se sabe, haveria um certo bloqueio do tablet para a plataforma (portanto, mais que plataforma, seria algo no sentido de um sistema operativo ou de uma app bastante especial, mas continuar-se-á a chamar-lhe plataforma por razões de estética textual).

   Adicionalmente, esta plataforma poderia e deveria conter também a matéria a leccionar, sob os mais diversos suportes, substituindo, assim, os manuais escolares (o que, embora possa ser bastante incómodo para o grande lobby das editoras, sem ofensa para os eventuais ofendidos, acaba por ser bastante benéfico para as carteiras das famílias), além de permitir igualmente que o aluno tome eventuais apontamentos, para complementar a informação da plataforma, fazendo, portanto, as vezes do que hoje seria um caderno diário (o que, se formos a ter em conta tudo o que foi dito antes acerca da plataforma e do seu funcionamento, implica que, exceptuando eventuais equipamentos específicos para matérias mais práticas, o único material necessário será o tablet e o “material de escrita” apropriado, reduzindo o peso das mochilas, para alívio de pais, alunos e costas destes últimos e para rejúbilo e desânimo simultâneos de ortopedistas). Claro, esta plataforma seria acessível na escola e em casa, embora, para efeitos de verificação da aquisição de conhecimentos, só se contabilizassem, como já se referiu, os exercícios resolvidos em aula (os trabalhos de casa obrigatórios serão, em última análise, desnecessários neste sistema de ensino, também devido ao prejuízo que trazem aos alunos e aos seus tempos supostamente livres; claro, se o aluno quiser fazer exercícios em casa, pode… mas não há prescrição específica de exercícios para resolver em casa, com a eventual excepção dos exercícios inacabados em aula).

   Posto isto, poderemos, finalmente, falar um pouco de como seria o presumível funcionamento deste sistema de ensino. É certo que, por ainda não ter sido posto em prática, há muitas especificidades organizacionais ainda a determinar (mais que não seja porque ainda falta delinear completamente a árvore do conhecimento), mas, fazendo o esforço de imaginação e/ou de pensamento necessário para visualizar este sistema posto em prática, poderemos identificar já uns quantos aspectos que convém frisar.

   Em primeiro lugar, a progressão ao longo de cada um dos mini-ciclos de leccionamento da árvore do conhecimento não deve ser vista como tendo qualquer grau de obrigatoriedade; ou seja, caso o aluno não queira prosseguir para um dado conhecimento posterior, é perfeitamente livre de o fazer (e, inversamente, escolher prosseguir para um conhecimento não o impedirá de prosseguir para quaisquer outros: não haverá mini-ciclos mutuamente exclusivos). É certo que isto poderá ser a modos que um convite ao abandono escolar (que, apesar disto, seria expectavelmente reduzido pela igualmente expectável redução do desinteresse no âmbito deste sistema de ensino), mas, por um lado, convirá haver uma boa rede de apoio às decisões dos alunos, constituída pela sociedade no seu todo (mas com maior incidência na família do aluno, nos intervenientes directos no seu processo de ensino – professores e funcionários, portanto – e por uma eventual rede de psicólogos mais ou menos especializados em orientação vocacional), e, por outro lado, haverá sempre uma obrigação indirecta da aquisição de certos conhecimentos, no sentido em que, para desempenhar uma qualquer função que seja (o que, na actual organização social, corresponde a ter um determinado emprego), será necessário possuir um certo conjunto de conhecimentos (que a organização em mini-ciclos de leccionamento acaba por permitir seleccionar com uma maior precisão do que ao abrigo do actual sistema de ensino), pelo que, para fazer qualquer coisa que seja (à excepção, talvez, das tarefas mais simples), será necessário ter-se frequentado minimamente a escola. A objecção adicional a esta liberdade de escolha, a de que a eventual imaturidade dos alunos pode implicar escolhas erradas, é facilmente rebatível ao se evidenciar que, caso o aluno viesse a descobrir que fizera uma má escolha (fosse por concluir que o conhecimento escolhido não o interessava assim tanto, fosse por achar que não tinha propriamente capacidades para o adquirir e para progredir a partir daí, fosse porque fosse), apenas perderia o tempo que gastou a frequentar as aulas do mini-ciclo em causa (que, por definição, ocupará sempre um período de tempo reduzido) e facilmente, muito mais facilmente do que no actual sistema de ensino, poderia reverter a sua decisão e passar a frequentar um outro mini-ciclo. Além disto, esta facilidade de mudar as decisões sem grande prejuízo de tempo permitiria aos alunos experimentar as várias áreas do conhecimento sem comprometer grandemente o seu futuro, o que, por sua vez, possibilitaria que o aluno pudesse muito mais facilmente encontrar aquele que seria o seu rumo.

   Sem nos desviarmos muito deste âmbito da selecção e da frequência dos mini-ciclos, também importará referir que faria sentido termos a garantia de que o aluno, ao retornar a um qualquer conhecimento passado já algum tempo de ter frequentado o último mini-ciclo nessa área, ainda tem os conhecimentos que servem de base ao que pretende adquirir. A forma mais eficiente parece ser fazer-se a verificação (idealmente pela ainda inexistente análise neural, mas, por agora, pela realização dos exercícios; no entanto, tendo os conhecimentos já sido adquiridos, esta verificação seria mais expedita, bastando, talvez, a resolução correcta de uns poucos exercícios no acto da inscrição – que, conforme veremos mais à frente, será efectuada através da plataforma on-line) da aquisição dos conhecimentos necessários que não tenham servido de base a qualquer aprendizagem ou tarefa do aluno em causa (pressupondo-se, portanto, que, se tiverem servido de base, estarão mais ou menos a ser necessários e, por isso, o aluno ainda os saberá; é certo que isto não será absolutamente infalível, mas acaba por ser a forma que faz mais sentido) nos últimos anos (embora já se tenha pensado no valor exacto de um ano, ou no valor redondo de cinco anos, não há, por agora, um valor concreto fixado para isto…); caso o aluno não satisfaça essa verificação, terá de repetir o mini-ciclo em causa (o que, apesar de ser repetição de matéria, acaba por ser pouco grave, tendo em conta a sua curta duração). Um pouco agregado a isto vem o pormenor de o ensino, ao abrigo deste paradigma, não ter propriamente um limite máximo de idade, no sentido em que, desde que se garanta este pormenor que se acabou de se referir, não haverá qualquer impedimento a que se frequente qualquer mini-ciclo de leccionamento. É certo que isto se poderia tornar muito rápida e facilmente num pesadelo logístico, mas falaremos destas e doutras questões logísticas dentro em breve.

   O terceiro aspecto que fará sentido referir é o facto de, pela forma como se dá a progressão ao longo da árvore do conhecimento, não fazer sentido equacionar as coisas em termos de turmas e horários fixos. Isto, embora possa ter efeitos adversos a nível do desenvolvimento psico-social (talvez até nem tanto, porque os alunos até que poderiam contactar sempre com as mesmas pessoas, nos “recreios” e fora das aulas… a única diferença está mesmo no facto de, assim, interagirem por vontade e não por idiossincrasia burocrática do funcionamento do sistema de ensino, que poderia forçar os alunos a lidar, mesmo que minimamente, com pessoas com as quais poderiam não se querer relacionar), garante precisamente mais flexibilidade, até mesmo em termos de burocracia, já que, idealmente, o aluno faria a “inscrição” através da plataforma on-line, que lhe mostraria os mini-ciclos que iriam ser leccionados daí a pouco tempo (com uma certa antecedência, claro). Em termos de horário, teria de se ter em conta as horas que se tem disponíveis e as que o mini-ciclo pretendido ocuparia, sendo isto mais uma coisa realizada com relativa facilidade pela plataforma on-line; seria aconselhável, por questões diversas de desenvolvimento pessoal, social e mesmo familiar, impor um limite máximo de oito horas de aulas por dia (valor sugerido, mas mais exemplificativo que informativo), mas, por outro lado, esta imposição vai um pouco contra a filosofia de flexibilidade e liberdade de escolha que, em última análise, o resto deste sistema de ensino acaba por advogar, pelo que se deveria deixar o aluno ter quantas aulas quisesse/pudesse (ou a família deixasse…), por sua própria conta e risco (ou seja, com avisos diversos na plataforma a desaconselharem a decisão de ter mais do que o número máximo de horas e a sugerirem mais tempo de repouso); eventualmente, para evitar excessos de esforço (seja por excesso de zelo do aluno, seja por pressão excessiva da família), poder-se-ia implementar algum tipo de alerta automático às equipas de psicólogos de apoio escolar quando um aluno ultrapassasse recorrentemente o limite horário, para que essa entidade agisse e averiguasse a situação, não no sentido de o vexar ou vitimizar, mas sim no de tentar detectar e resolver qualquer problema.

   Chegados aqui, e na continuidade das últimas especificidades que temos vindo a referir, teremos de abordar a organização em termos espácio-temporais dos mini-ciclos de leccionamento, que corresponde, portanto, a começar a falar das principais questões logísticas deste sistema de ensino. A mais relevante para tudo o resto que se irá dizer será, de facto, a selecção e distribuição dos mini-ciclos no tempo e no espaço. A selecção seguirá, muito simplesmente, um modelo de oferta e de procura, no sentido em que se dará primazia aos mini-ciclos mais solicitados e/ou mais desejados (algo eventualmente determinável através de algum tipo de sistema de “pedidos de mini-ciclos”, de wishlist, para usar um termo estrangeiro, na já muito falada plataforma); no entanto, para que isto não constitua um condicionamento das vontades e/ou tendências naturais dos alunos, teremos de tentar diversificar ao máximo a oferta e incluir a possibilidade adicional de aulas à distância (mas, se os leitores permitirem o suspense, já lá vamos…).

   Quanto ao tempo, há que responder a uma questão muito pertinente (mas sempre controversa): qual é a duração ideal para uma aula? Tendo todas as nossas tentativas de responder a esta questão resultado (pelo menos, até agora) em nenhuma resposta conclusiva e definitiva, teremos de remeter para um sempre útil “depende”. Se é certo que 90 minutos seguidos de teoria são bastante difíceis de suportar e 50 mais 50 minutos com um intervalo pelo meio quebram demasiadamente o raciocínio, também é certo que algumas actividades, de domínios mais práticos, necessitam de um pouco mais de tempo para poderem ser melhor treinadas e/ou executadas; nesse sentido, o melhor será fazer a duração de cada aula depender da natureza do mini-ciclo a que pertence, mas, possivelmente, sempre em valores múltiplos de 30 minutos (para facilitar a construção dos horários de alunos e professores, actividade que se assemelharia a um certo puzzle, com a plataforma a auxiliar a colocação dos “blocos” de cada aula nos espaços disponíveis no horário). Independentemente da duração das aulas, por questões de regularidade, cada mini-ciclo deveria ocorrer sempre à mesma hora durante os dias em que fosse leccionado, sendo que, consoante os horários disponíveis de alunos e professores, poderia ter lugar uma ou mais vezes por semana. Adicionalmente, no que toca ao posicionamento das aulas ao longo do dia, ter-se-ia, provavelmente, de ter em conta os pedidos dos presumíveis alunos, no sentido de garantir que a aula decorreria na altura mais apropriada (pense-se, por exemplo, no caso dos trabalhadores-estudantes e/ou de trabalhadores que pretendam aprofundar os estudos), com a inevitável condição de ser também compatível com os horários dos professores (não, não estão esquecidos… apenas acontece que, exceptuando alterações em questões burocráticas e organizacionais, ensinar ocorreria de uma forma praticamente idêntica ao actual sistema de ensino, pelo que se deu primazia à descrição das mudanças mais abrangentes que ocorreriam no caso dos alunos… mas já falaremos disto mais à frente…). Convém destacar também que, havendo mini-ciclos de leccionamento, as aulas poderiam ocorrer durante todo o ano, com a excepção de eventuais interrupções por motivos de limpeza, manutenção ou manifestações mais ou menos disruptivas da natureza; neste sentido, alunos e professores poderiam tirar férias quando mais lhes aprouvesse (com aviso prévio no caso dos professores, obviamente, e não propriamente depois de terem começado a leccionar um mini-ciclo…), sendo que alunos talvez pudessem ter tantas quantas a sociedade (leia-se a família) os deixasse (no sentido em que a frequência dos mini-ciclos não é obrigatória, como se referiu, e também para compensar a inexistência dos cerca de três meses de férias que o actual sistema de ensino lhes proporciona), enquanto que os professores teriam de se manter pelo número de dias de férias legalmente consagrado aos trabalhadores (mas não há razão para estes desanimem: afinal, este sistema de ensino gera menos burocracias e menos trabalho trazido para casa, pelo que os professores também sairão a ganhar…)

   No que toca ao espaço ter-se-á, obviamente, de ter em atenção as instalações e os equipamentos disponíveis (por exemplo, não faz sentido leccionar mecânica numa escola sem oficinas apropriadas…), além das questões diversas de oferta e de procura, embora sempre com a preocupação adicional da diversificação dos mini-ciclos, no sentido em que qualquer região deveria, dentro do género, ter a grande maioria dos conhecimentos a ser leccionada num raio não muito grande (poder-se-ia sugerir o número artificial e vagamente arbitrário de 25 km, mas, tal como os outros, trata-se de um valor meramente exemplificativo e, portanto, bastante passível de revisão), bem como com o eventual cuidado de tentar evitar o contacto dos alunos com grandes diferenças etárias, por isso dar azo a um certo número de situações potencialmente indesejáveis; claro, as aulas à distância também entrariam aqui, no intuito de garantir que todos os alunos podem frequentar os mini-ciclos de leccionamento que quiserem.

   Bom, posto isto, fará sentido tentar referir a forma como actuariam os professores. Em termos de pedagogia, teriam a liberdade de usarem os meios à sua disposição conforme considerassem mais correcto (dando, se possível, primazia aos diferentes recursos da quase omnipresente plataforma). Em termos da sua atribuição aos diversos mini-ciclos, esta teria em conta, obviamente, as suas capacidades e conhecimentos, mas conviria garantir, dentro do género, a existência de uma certa rotatividade, para que um professor não esteja sempre a ensinar o mesmo tipo de coisa e para que os alunos possam frequentar os módulos dos professores cujo método pedagógico mais apreciam e/ou evitar aqueles cujo método não apreciassem (seria divulgado antecipadamente quem ensinaria cada mini-ciclo). Claro, os professores seriam os mesmos ao longo de um mesmo mini-ciclo e também estariam sujeitos a um horário (um pouco como hoje em dia, com o pormenor adicional de as horas irem mudando), tentando cumprir o número de horas de trabalho semanais correspondente a qualquer outro trabalhador (mas, tendo em conta que não será necessário designar horas especificamente para direcção de turma – porque não há turmas que dirigir – nem para questões departamentais – porque não há propriamente testes ou disciplinas fixas para os quais seja necessária uma qualquer deliberação do conjunto dos professores a que dizem respeito –, a grande maioria destas horas seriam, de facto lectivas, exceptuando períodos de tempo dedicados à preparação de aulas futuras e outras actividades semelhantes). No caso de, por qualquer motivo que seja, terem de faltar a uma aula, tentar-se-ia arranjar um outro professor para dar substituição (mesmo substituição, não a mera “ocupação lectiva de tempos livres”, que costuma ser apenas um eufemismo para “vamos lá manter os miúdos aqui ocupados com tretas diversas para não andarem a fazer porcaria lá fora”) ou, se tal não for possível, reagendar essa aula para uma data e uma hora que convenha a todos (nesse sentido, talvez não fosse má ideia criar um segmento do horário dos alunos e professores, o “período de reposição”, que serviria exactamente para repor aulas não dadas, ficando desocupado na ausência destas; uma possibilidade seria a de designar para isso parte da tarde de sexta-feira).

   Prosseguindo para assuntos um pouco mais ligeiros, convirá referir que, apesar da abdicação do conceito de turma (e, num certo sentido, mesmo de escola como entidade individual), não terão obrigatoriamente de desaparecer as visitas de estudo, sobretudo porque podem auxiliar a compreensão da matéria. No entanto, para garantir que os alunos têm, de facto, uma matéria para compreender, faria sentido que só se pudessem inscrever numa visita os alunos que tivessem completado os mini-ciclos correspondentes aos conhecimentos que essa mesma visita de estudo iria estimular/utilizar/demonstrar, ainda que esta exigência devesse ser mais genérica do que específica (por exemplo, para uma visita a um qualquer aquário, dever-se-ia ter aprendido qualquer coisa de Biologia, embora essa coisa tanto poderia ser Ictiologia, Oceanografia, Taxonomia, Ecologia, Zoologia ou, num certo sentido, até mesmo Botânica, pela parte do plâncton, entre possíveis outras). Mas, claro, este aspecto é, na generalidade, bastante irrelevante, e apenas se incluiu isto aqui no intuito de não deixar esta questão das visitas de estudo em aberto, à semelhança de muitas outras que, por ainda não terem sido colocadas, ainda não foram respondidas. Os leitores podem tomar isto como um convite a colocarem, de facto, as eventuais questões que possam ter.

   Bom, falta falar da já referida questão das aulas à distância. Basicamente, no caso de, por qualquer motivo que seja, um aluno pretender frequentar um mini-ciclo indisponível na sua proximidade (algo mais ou menos inevitável se pensarmos nos mini-ciclos mais avançados ou… enfim… esquisitos), podê-lo-ia fazer sem necessitar de se deslocar até longe, para a eventual escola onde houvesse (se houvesse…) o mini-ciclo pretendido, ao comunicar por vídeo-conferência (e cá estará a plataforma on-line outra vez…), com um professor, algures, que pudesse assegurar esse leccionamento (juntar-se-iam vários alunos em vídeo-conferência com o professor, para tornar a cosia mais eficiente; claro que, se um aluno pretender o mini-ciclo há já algum tempo – digamos, um mês – e mais ninguém aparecer a querer frequentá-lo, o aluno poderá e deverá ter direito a aprender, por menos eficiente que isso seja). Aliás, se necessário, este até se poderia tornar o modelo para a maioria dos mini-ciclos dos ramos, o que, apesar de parcialmente indesejável (é sempre melhor poder interagir literalmente cara-a-cara do que por intermédio de um ecrã), poderá ser a melhor forma de garantir a todos os alunos a liberdade de escolha e a flexibilidade que este sistema de ensino tem como elementos centrais.

   Para terminar (e os leitores que perdoem a extensão desta descrição, mas a intenção é unicamente a de tentar eliminar, logo à partida, a maioria das dúvidas e questões relativamente a este sistema de ensino), seria altura de se fazer referência a um aspecto que, apesar de não estar quase nada relacionado com o sistema de ensino, é, ainda assim, visto por muitos como sendo de superior importância: o dinheiro, ou seja, os aspectos financeiros da coisa. Então, quanto é que custaria frequentar este sistema de ensino? A resposta que toda esta descrição parece delinear é: “muito pouco”. É certo que há que adquirir o tablet necessário, mas esse custo (além de possivelmente comparticipado pelo estado, como se referiu, ao abrigo de uma qualquer iniciativa nesse sentido) seria único e daria acesso à grande maioria dos materiais necessários (o exacto oposto dos gastos anuais com manuais e materiais diversos), pelo que, até no aspecto monetário, este sistema seria mais benéfico para os alunos e para as suas famílias. Não se falou da plataforma, em termos de eventuais custos de acesso/subscrição que poderiam ser instituídos como forma de suplantar os custos operacionais dessa mesma plataforma, mas, mesmo que equivalham a qualquer coisa entre 50 a 100 € anuais (o que, muito provavelmente, seria um exagero…), não tornariam este sistema, no geral, menos acessível que o actual, antes pelo contrário…

   E, tendo nós chegado ao fim desta (longa!) Inovação, não seria, de todo, má ideia se, dentro do género, fizéssemos um resumo de tudo o que foi dito em relação a este sistema de ensino alternativo dos mini-ciclos de leccionamento. Ora bem, temos a divisão do conhecimento (teórico e prático) em partes mais ou menos indivisíveis, precisamente mini-ciclos de leccionamento, que se agrupam e organizam de cordo com as relações de inter-dependência de uns relativamente aos outros, sendo transmitidos em aulas cuja duração varia consoante a natureza do conhecimento em causa. Cada aluno é livre de escolher os mini-ciclos que quer, ou não, aprender, sendo a aquisição do conhecimento verificada a partir do facto de o aluno conseguir realizar correctamente os exercícios ou tarefas correspondentes à matéria dada (no caso do conhecimento teórico, os exercícios encontram-se reunidos numa plataforma on-line, que contém igualmente a matéria leccionada e permite, entre outras coisas, a inscrição em novos mini-ciclos e a elaboração do horário), havendo uma escala de avaliação binária (ou o aluno adquiriu integralmente o conhecimento leccionado, podendo, por isso, progredir para os mini-ciclos seguintes, ou não adquiriu e não pode progredir) e, por outro lado, não havendo nem testes, nem exames, nem trabalhos de casa. E pronto. É isto. Passaremos, agora, à Comparação, se os leitores ainda tiverem a (força de) vontade de continuar a ler…



Mini-Ciclos de Leccionamento – Um Paradigma Alternativo de Ensino
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