10 de agosto de 2016

Dos Aspectos Organizacionais dos Exames

   As mais que habituais saudações a todos os leitores (e também aos que não o sejam, mas que, precisamente por isso, nunca saberão que lhas dei, que é o mesmo que nunca lhas ter dado…). Admito já que o tema, hoje, é pouco pertinente, mas, enfim, acaba por ser uma questão do actual sistema de ensino que ainda não abordei totalmente, pelo menos não neste sentido, e que acabou por ser a única coisa que consegui mais ou menos encontrar.

   Espero que, por esta altura, já seja sobejamente conhecida a minha total oposição aos exames nacionais; não voltarei a argumentar aqui, porque, convenhamos, nem sempre é exclusivamente pela fadiga que se vence, e muitas vezes a repetição excessiva desvirtua e desvaloriza os argumentos. Portanto, já sabem que, para mim, não haveria exames. Só que… há (chocante, não é? Acho que grande parte dos leitores não estava à espera de tal revelação…). E, nesse sentido, há algumas especificidades organizacionais que, não sendo directamente decorrentes dos exames, surgem, na mesma, da sua existência, e que, em parte devido à minha intensa oposição aos exames, ainda não tive a presença de espírito de abordar propriamente. É basicamente isso que espero vir para aqui fazer.

   Em primeiro lugar, as fases. Aqui, podemos dizer que até que é das partes menos mal pensadas disto tudo (não que isso seja dizer muito…). Afinal, dá-se aos alunos o direito de, se assim quiserem (ou se de tal necessitarem), repetir o exame, o que dissipa, em parte, aquela questão de haver um dia em que, por uma conjugação anormal de factores ambientais adversos, não se está na melhor das formas, e retira parcialmente o pendor definitivo do exame (ainda que, havendo só duas hipóteses, este ainda exista, e também não é, de todo, impossível que se tenha dois dias maus precisamente na altura mais inconveniente, ainda para mais porque o exame é um factor de stress, e o stress é um factor muito importante no que toca a ter dias maus…). O problema é que, havendo dois exames, haverá dois conjuntos diferentes de exercícios, o que implica que há diferentes graus de dificuldade, o que, num certo sentido, pode gerar injustiças (embora, diria eu, não mais do que os exames per se conseguem gerar…), e isso a modos que anula o tal propósito sagrado dos exames, o de assegurar a igualdade de circunstâncias entre alunos. Diriam alguns que é por estas e por outras que há, depois, fases diferentes de candidatura, mas não vale muito a pena irmos por aí porque, simultaneamente, tal não se aplica no caso do 9.º ano (onde há, na mesma, duas fases, embora a segunda só seja mesmo para aqueles que não passam na primeira, se não me falha a informação), e também a divisão entre o ensino superior e o restante, o tal a que sou levado, por exclusão de partes, a chamar “inferior”, não é, para mim, facto assente e assunto enterrado…

   Em segundo lugar, as inscrições. Isto, claro, diz respeito aos exames de 11.º e de 12.º e não tanto aos do 9.º, porque aí é automática (se não me equivoco), mas não deixa de ser mais um aspecto dos exames que poderemos abordar. Claro que, por toda e qualquer forma de lógica, faz mais do que sentido que, havendo uma vasta gama de exames, todos realizáveis independentemente da situação do aluno, tenha de haver algum tipo de aviso prévio em como se vai efectuar o A, o B e o C e não o D, o E ou o F; no entanto, sou levado a perguntar-me: num mundo onde já tanta coisa é efectuada por meios electrónicos, até mesmo no âmbito do ensino, por que razão se mantêm as inscrições em papel? É que, além de considerações ecológicas diversas, este estado de coisas só leva a que se estabeleçam filas enormes nas secretarias das escolas, como qualquer aluno prontamente poderá testemunhar (juntamente com o facto de as secretarias nem sempre serem pináculos da eficiência…), gerando atrasos que, mesmo que não impeçam a inscrição em si, sempre a tornam mais uma fonte de stress e de desagrado, algo que não se verificaria caso a inscrição se efectuasse por via electrónica (descontando eventuais problemas informáticos, que, por vezes, têm o desagradável costume de surgir em tudo quanto sejam sites, plataformas ou portais públicos…). E há, claro, uma outra vantagem, além deste maior conforto na inscrição, que é uma maior eficiência no processo de recolha e tratamento dos dados relativos às inscrições (no sentido em que a informação toda estaria mais ou menos centralizada no site da inscrição), o que resultaria na redução dos custos organizacionais disto tudo. E, por falar em custos, posso também referir que o custo desnecessário do próprio impresso de inscrição para os exames seria, assim, evitado (pode não ser tão exorbitante assim, mas é francamente desnecessário, face à velha história de o ensino dever ser “tendencialmente gratuito”, e afigura-se-me vagamente exagerado face ao custo dos materiais envolvidos na sua produção)…

   Em terceiro (e último) lugar, temos a questão das reapreciações de prova. Este acaba por ser outro aspecto medianamente positivo, no sentido em que reconhece que todo o ser humano é intrinsecamente falível e providencia uma forma de, dentro do género, contornarmos algumas situações provocadas por essa falibilidade; há é uns quantos problemas na sua execução. Acima de tudo, a impossibilidade de se contestar os critérios de correcção acaba por equivaler à admissão da infalibilidade dos responsáveis pela elaboração desses mesmos critérios, coisa que é, obviamente, falsa (está bem que as associações de professores da disciplina dão pareceres, mas parece-me que nunca nenhum desses pareceres teve grande efeito…). Por outro lado, os efeitos da reapreciação assumem uns contornos, a meu ver, demasiado punitivos, no sentido em que agem como um agente dissuasor tão intenso que transforma a reapreciação numa oportunidade apenas aparente, criada e concebida para fazer parecer que se tem em conta a falibilidade dos correctores, quando, na verdade, praticamente não se tem. Estou a falar precisamente do duplo facto de a reapreciação de prova incidir sempre sobre a totalidade do exame e de a nota dada ser final; a meu ver, ou se permitia ao aluno pedir a reapreciação apenas dos exercícios nos quais considerasse ter havido má aplicação dos critérios (para reduzir as possibilidades de ser prejudicado nos outros exercícios, onde a ambiguidade da resposta ou do critério poderia permitir essa margem de manobra por parte do corrector), ou se daria a garantia de que prevaleceria sempre a melhor das duas classificações, ou, se quisermos ser mesmo simpáticos, que ficaria a melhor das cotações em cada exercício (impedindo, assim, que o aluno fosse prejudicado só pelo facto de pedir a reapreciação de prova). E isto é para não falar no dissuasor ainda mais significativo que é o custo da reapreciação. Bem, posso vagamente tentar compreender – isto é um processo vagamente moroso, burocraticamente conturbado e causador de não pouco desconforto aos professores a quem calha a “batata quente” do trabalho adicional; nesse sentido, quanto menos pedidos de reapreciação houver, melhor para toda a organização disto tudo, mas, convenhamos, para quê darem a hipótese e depois tentarem levar as pessoas a não a efectuar? Não consigo encontrar uma resposta que permita manter uma visão positiva e elogiosa das instituições em causa e que, ao mesmo tempo, se afigure como minimamente satisfatória…

   Mas pronto, tudo isto são faits divers, críticas, contestações e sugestões perfeitamente supérfluas, porque o essencial é mesmo acabar com os exames e não corrigir pequenas questiúnculas que deles decorrem, porque eles próprios são uma abjecção tão grande que supera quaisquer esforços de melhorar as coisas sem os eliminar. O que quer dizer que mais valia não ter escrito isto tudo, mas agora já vou tarde…

   Enfim, espero que a próxima entrada já tenha um assunto mais relevante, e é por isso que me despeço de vós, caros leitores, aguardando já pela inspiração que me permita escrever essa entrada, na qual espero que nos reencontremos…

Sem comentários:

Enviar um comentário

Este espaço está à disposição de todos os leitores, seja para elogiar, seja para criticar, seja para, pura e simplesmente, comentar. O autor reserva para si o direito de responder conforme tenha disponibilidade.