28 de dezembro de 2015

Sobre as Visitas

   Não, não se trata de uma reflexão vagamente anti-social e ressentida sobre as visitas mais ou menos inesperadas e mais ou menos indesejáveis que, quase inevitavelmente, surgem nesta época festiva. Coisa, que, de resto, ficaria assaz deslocada no meio de todas as coisas que digo sobre o ensino neste blog. Mas pronto. Poderia ter-me saltado a mola de vez e ter passado a escrever coisas (ainda mais) sem sentido e sem lógica… Mas não. Decidi hoje falar-vos das visitas de estudo e, mais especificamente, da efectuação das visitas de estudo no âmbito dos Mini-Ciclos de Leccionamento.

   Não posso, de modo algum, negar que as visitas de estudo podem contribuir de uma maneira significativamente positiva para as aprendizagens, ao permitirem que, dentro do género, se vejam postos em prática, em situações concretas e reais (a não ser que a visita de estudo incida sobre uma qualquer situação criada propositadamente para fins didácticos, caso em que se torna, apenas, uma situação concreta), os conhecimentos adquiridos, o que, em muitos e variados casos, contribui para a consolidação desses mesmos conhecimentos (a não ser que se seja um anti-empirista como eu, mas isso é outra história…). Nesse sentido, somos levados a concluir que as visitas de estudo são mais ou menos desejáveis. Só que também não podemos esquecer que há muitos casos em que as visitas de estudo constituem pouco mais do que uma desculpa para a borga, tendo, por vezes, quase nenhum sentido para além desse. E isto, meus meninos, não pode ser.

   Não estou propriamente a publicitar um estilo de vida monástico e espartano, desprovido de toda e qualquer alegria, de toda e qualquer diversão, nem tão pouco estou a incorrer no cliché de pedir borga, mas com calma (o que, por si só, constitui um contra-senso e uma contradição injustificáveis). Apensas não posso deixar de referir a incoerência da atitude da maioria, aproveitando toda e qualquer oportunidade para a folia, mas cedendo, quase imediatamente após esta acabar, aos apelos de “estudem para os testes!”, “façam os trabalhos de casa!”, “não se esqueçam das apresentações orais!”, “tenham cuidado com os exames!” e afins. Ora, não seria mais lógico se, em vez de tentarmos escapar sempre que pudermos ao enorme desconforto que estudar no actual sistema de ensino representa, nos esforçássemos para acabar com esse mesmo sistema de ensino e implementar um outro, em que os momentos de folia não tivessem de ser roubados, mas sim surgissem naturalmente (por estar ausente uma grande parte das tarefas – trabalhos de casa, pesquisas, estudos específicos para testes/exames… – que hoje em dia ocupam tanto tempo)? Bom, podia prosseguir para o apelo do costume relativamente à implementação dos Mini-Ciclos de Leccionamento, mas creio que seria vagamente repetitivo e, por isso, abster-me-ei de o fazer (ainda que, indirectamente, já o tenha feito ao dizer que o poderia fazer…).

   Independentemente deste meu aparte (bastante grande, diga-se de passagem), creio que já todos pudemos ver (como seria óbvio para alguns, um pouco menos, talvez, para mim) que as visitas de estudo, se apropriadamente seleccionadas de modo a estarem relacionadas com a matéria, até que são desejáveis, e isto é uma coisa que, excepcionalmente, o actual sistema de ensino até que tem a possibilidade de não fazer mal: tendo em conta a progressão de todos os alunos através de um programa pré-estabelecido, torna-se relativamente simples organizar, a nível escolar, do agrupamento ou da zona, uma visita de estudo precisamente na altura em que os conhecimentos que com ela se relacionam já foram leccionados (preferencialmente há pouco tempo, para estarem o mais frescos possível). Mas isto, apesar de ser uma vantagem do actual sistema de ensino, não elimina toda a montanha de desvantagens que ele tem. Nesse sentido, já sabem que considero mais desejável que se siga o paradigma dos Mini-Ciclos de Leccionamento, pelo que é no âmbito deste sistema, e dos seus condicionalismos organizacionais, que passarei a avaliar as visitas de estudo. Se não se importarem, claro.

   Bom, progredindo cada aluno de uma forma independente dos outros, torna-se bastante mais difícil conseguir coordenar as coisas de modo a que os conhecimentos dos alunos e as visitas de estudo estejam relacionados. Talvez isto possa ser conseguido se se organizar as visitas de modo a que os alunos só se possam inscrever (naturalmente, através da plataforma electrónica associada aos Mini-Ciclos) caso tenham adquirido os conhecimentos relacionados (numa forma vagamente reminiscente aos requisitos dos módulos, embora, para as visitas de estudo, os requisitos devam ser mais latos; por exemplo, faz sentido que, para uma visita a um qualquer aquário/oceanário/fluviário/et-caetera-ário, se tenha de ter aprendido qualquer coisa de Biologia, ainda que essa coisa, a meu ver, tanto possa ser Ictiologia, Oceanografia, Taxonomia, Ecologia, Zoologia ou, num certo sentido, até mesmo Botânica, pela parte do plâncton). Isto poderia muito provavelmente constituir um pesadelo logístico, pelo que seria lógico verificar-se, algum tempo antes da visita (três, quatro meses?), qual será o número de interessados, algo que, dentro do género, já se faz actualmente, por uma razão semelhante.

   No sentido de garantir igualmente que os alunos usufruem ao máximo das visitas de estudo, parece-me não ser má ideia tentar simultaneamente diversificar o âmbito das visitas o mais possível (para que se possa contactar com o máximo possível de realidades práticas) e realizar regularmente as mesmas visitas (para que todos os alunos possam ter, dentro do género, as mesmas experiências). Admito que estas duas práticas estejam fortemente condicionadas pela disponibilidade de meios (sobretudo financeiros), das escolas e das famílias, mas, exactamente nesse sentido de retirar pressão sobre esses meios, creio ser bem pensado realizar as visitas de estudo intervaladamente, num ciclo de alguns anos, que não deve ser nem muito grande, sob pena de um aluno que falhou por pouco uma visita não voltar a ter a hipótese de a efectuar, nem muito pequeno, para não enfadar os eventuais professores assistentes e para não sobrecarregar os alunos com visitas e as famílias e as escolas com gastos diversos (e além disso porque o facto de se estar a falar de ciclos de visitas de estudo no âmbito dos Mini-Ciclos não implica que haja mini-ciclos de visitas de estudo…). A propriedade adicional de os alunos se poderem inscrever em visitas de estudo de outras escolas pode vir a facilitar esta gestão.

   Bom, no fim de mais uma entrada inconclusiva e inútil (mas antes escrever coisas assim do que não escrever de todo…), tenho, apenas, a agradecer aos leitores que chegaram até aqui por terem suportado durante tanto tempo a minha prosa vagamente (por vezes, mais que vagamente…) enfadonha e confusa, bem como as que não conseguiram chegar até ao fim por terem tentado (embora esses fiquem alheios a este agradecimento…). Deixo o habitual convite para se servirem do espaço de comentários.

   Se não escrever mais nada até lá, um Próspero Ano Novo a todos (tirando àqueles que se possam reger por um outro calendário, cujo ano não acabe esta semana; a esses, desejo-lhes, apenas, uma boa semana, já que não é ainda altura do seu ano novo…).

22 de dezembro de 2015

Da Separação dos Poderes Educacionais

   Já por diversas vezes expressei a minha vontade de não trazer para este blog qualquer tipo de reflexão de ordem político-partidária, não só por ser plenamente apartidário, mas também por não ser esse o tema do blog. Porém, há certos assuntos da Educação com implicações políticas (mais significativas, leia-se, já que, em última análise, poderíamos afirmar que praticamente tudo o que fazemos tem uma qualquer implicação política) que não posso deixar de abordar só pelo facto de assim serem. O assunto que escolhi para esta entrada é um desses casos.

   A quem pertence o ensino? Pergunta vagamente estúpida, admito, e ainda mais confusa e irrelevante, mas, ainda assim, tentemos responder-lhe. Ora bem, se tivermos em conta aquela perspectiva de que o ensino deverá servir para transmitir conhecimentos racionais, poder-se-á dizer que que dirá respeito maioritariamente àqueles que transmitem os conhecimentos (professores) e aos que os recebem (alunos); juntamente com estes, teremos também de considerar todos os restantes que, embora não intervindo directamente nesse processo de transmissão e recepção, ainda assim acabam por ser essenciais para permitir que esse processo ocorra (pessoal não docente). Só que não podemos ignorar que todas estas pessoas estão inseridos num grupo mais vasto, o da sociedade, pelo que quaisquer coisas que os afectem irão, em última análise, afectar toda a sociedade; mais a mais, os conhecimentos transmitidos são, dentro do género, importantes para que os indivíduos desempenhem (ou não) funções futuras (e abster-me-ei, pelo menos por agora, de emitir juízos de valor relativamente a esse facto, decorrente da actual organização social…), pelo que, por esta perspectiva, também se acaba por concluir que o ensino diz respeito à sociedade no seu todo. Fica, assim, estabelecido que o ensino é de todos nós, e isto só nos pode levar a concluir que todos deveríamos poder ter algo a dizer relativamente a ele. Não, calma, ainda não vou para a pregação do costume…

   Bom, se todos deveríamos ter algum poder de decisão no âmbito do ensino, e se este, de facto, é relevante para a totalidade da população, parece fazer sentido que os processos decisivos estejam desligados de quaisquer interesses políticos, ficando, por isso, a cargo de uma entidade exterior ao governo, independente deste. Poder-se-ia objectar que, não tendo essa entidade fins lucrativos, estará sempre dependente do financiamento que o estado lhe poderia atribuir (o que levaria a que o estado a pudesse controlar na mesma), mas, mesmo sendo as coisas como são agora, já há essa particularidade, pelo que não estaríamos a originar novas indesejabilidades (ainda que estivéssemos a manter as que já existiam, o que, por si só, não é desejável, mas enfim…). Semelhantemente, também devido aos fins estritamente não lucrativos de qualquer entidade decisora no âmbito do ensino, a não intervenção política nessa entidade poderia levar a que os interesses puramente comerciais se tornassem mais preponderantes e pronunciados (em vez da forma sub-reptícia com que afecta a política), mas esta situação (além de, em parte, já ocorrer actualmente) será, em teoria, suplantada ao se fazer com que os eventuais cargos relevantes nessa entidade sejam desempenhados por pessoas escolhidas e não propriamente nomeadas (e isto tem a vantagem adicional de impedir que as nomeações variem consoante o panorama político, o que tornaria a entidade reguladora do ensino incrivelmente semelhante a um ministério, pelo menos nesse aspecto…).

   A questão será mesmo como se poderá efectuar essa escolha. Idealmente, dever-se-ia ter por base o mérito e a competência dos indivíduos, mas, sendo a aferição (sem trocadilhos, está bem?) destes aspectos extremamente difícil, sob diversos pontos de vista (e por diversos motivos), ter-se-á de recorrer, à falta de melhor, a algum tipo de sufrágio. Mas, para assim ser, teremos, também, de tentar definir, de uma forma que dê azo a limitada celeuma, quem deverão ser os eleitores. Logicamente, todos aqueles que fazem parte do funcionamento do sistema de ensino deveriam poder votar (falo, portanto, de alunos, encarregados de educação, pessoal não docente e professores, para os enunciar alfabeticamente ordenados). No entanto, tendo em conta que nem todos os alunos terão propriamente a capacidade de tomar essa decisão com pleno conhecimento de causa, há que, de alguma forma, estabelecer um limite mínimo de idade; não diria que fosse necessária a maioridade, apenas a maturidade, ainda que aferi-la seja muito subjectivo… talvez, não sei, 10 anos ou declaração de familiares ou psicólogos em como a pessoa em causa está apta? Bom, não interessa muito, é mais uma especificidadezinha organizacional, que não tentarei, pelo menos por agora, desenvolver. Voltando à questão dos votantes, creio ser importante deixar, também, a ressalva de que qualquer outro cidadão (que não esteja contemplado no grupo anterior, é claro) deverá poder, mediante um qualquer tipo de inscrição oficial, fazer também parte do grupo dos eleitores, já que, como comecei por dizer, o ensino diz respeito a todos.

   Mas estes votantes não deverão, a meu ver, desempenhar unicamente o papel de eleger pessoas para cargos diversos na entidade reguladora; deverão, também, participar em processos decisivos mais específicos, mediante alguma espécie de plataforma electrónica (eventualmente associada àquela que contém a matéria e os exercícios nos Mini-Ciclos de Leccionamento), que possibilite, de alguma forma, expressarem a sua opinião relativamente a assuntos de alguma importância. Não, não é propriamente para decidirem se se adquire um rolo adicional de papel higiénico para reabastecer as casas de banho da EB2,3 de Cascos de Rolha, mas também não lhes podemos negar a possibilidade de afectarem processos decisivos mesmo que apenas moderadamente importantes, ainda que esta classificação seja subjectiva, claro… Talvez o melhor fosse mesmo dar-lhes a possibilidade de se expressarem, de se manifestarem de uma maneira significativa, no sentido de afectar todas e quaisquer decisões que lhes possam interessar (em última análise, já o podemos fazer, mas… bom, não de uma forma que impacte directamente os processos decisivos…), exactamente através da plataforma informática de que antes falei.

   Bom, disse já tanta coisa, mas chego à conclusão de que o que disse é pouco menos que irrelevante, quando se tem em conta toda a infinidade de mudanças de que o actual sistema de ensino precisa tão desesperadamente. Mas, ainda assim, a criação de uma entidade reguladora do ensino exterior ao governo acaba por garantir escolhas (mesmo que marginalmente) melhores no âmbito da educação, por possibilitar uma maior constância das práticas positivas (por não ocorrer aquela situação, para alguns bastante negativa, para mim não mais que o resto do actual sistema de ensino, em que um ministro da Educação recentemente eleito desfaz, sem grande razão aparente, grande parte das medidas do seu antecessor), bem como, simultaneamente, uma mais rápida eliminação das práticas negativas (por não se ter de aguardar pela queda ou fim do mandato do governo para mudar as perspectivas das “cabeças pensadoras”, já que, e agora o acrescento, os votantes também poderiam, caso essa perspectiva fosse a maioritária, exigir a substituição de um qualquer membro da entidade por uma outra pessoa; além disto, e como já disse, também estaria na mão dos votantes intervir nos processos decisivos). Mas pronto. Esta reflexão tornou-se mais política, mais politizada e mais politizante do que pretendia, além de mais inútil e inconclusiva do que o que seria desejável, e, por isso, sou levado a apresentar-vos as minhas desculpas, caros leitores.

   De qualquer das formas, Boas Festas, caso considerem esta uma época festiva, Boas Férias, se as tiverem agora, ou Bom Dia (ou Tarde, ou Noite), se nenhuma das anteriores se aplicar. Eu por aqui me fico, deixando-vos, como de costume, o espaço de comentários, para fazerem o que bem entenderem com ele.

18 de dezembro de 2015

Da Verificação do (Des)Conhecimento

   Está já definido em entradas passadas que o propósito do ensino é, ou deveria ser, transmitir conhecimentos, especificamente conhecimentos racionais, preferencialmente raciocínios (por oposição à, e em detrimento da, memorização). Creio que isto é uma coisa em que poderemos todos concordar, sem grande margem para dúvidas.

   Ora, se o objectivo do ensino é transmitir esses conhecimentos, é em torno disto que todo o sistema de ensino deveria estar estruturado. Só que, actualmente, está mais centrado no cumprimento de requisitozinhos burocráticos e no seguimento de práticas e decisões que o passado, a tradição ou entidades hierarquicamente superiores (vistas quase como metafisicamente superiores, mas isso é outra história…) lhe conferiram. Mas isto, por palavras mais ou menos diferentes, já foi dito antes, e não é propriamente para ruminar a tendência conservadora do actual sistema de ensino que aqui estou hoje. Decidi, em vez disso (e também para, de alguma forma, celebrar este curto período de férias escolares que se iniciou ontem), focalizar-me um pouco mais (e mais uma vez) na questão específica da avaliação e dos métodos adoptados para a efectuar.

   Diga-se o que se disser, avaliar é sempre duvidar da eficácia do sistema de ensino. Se este funcionasse bem, e se tivéssemos essa certeza, poderíamos, sem problemas, dizer que todos os alunos adquiriram todo o conhecimento que lhes foi leccionado, sendo, por isso, desnecessário verificar se tal ocorreu. Só que, por motivos diversos (radicados maioritariamente na falibilidade humana e, por extensão, na falibilidade de todo e qualquer empreendimento humano), não podemos ter essa certeza. Nesse sentido, somos levados a adoptar um qualquer instrumento que nos permita aferir se o aluno adquiriu, de facto, o conhecimento que lhe foi leccionado. Mas, para tal, há que dar resposta a duas questões bastante revelantes: “Como se procederá a essa avaliação?” e “Que consequências deve ter essa avaliação?”.

   Começarei por abordar a primeira. Idealmente (e se me permitem um dedinho de Ficção Científica, que não está, de modo algum, relacionada com eventuais estreias de cinema que possam ter ocorrido recentemente…), dever-se-ia analisar a estrutura cerebral do aluno, de modo a determinar se as informações correspondentes ao conhecimento leccionado se encontram já adquiridas, algures na região cerebral correspondente à memória a longo prazo e/ou na região do cérebro dedicada ao tipo de actividade (motora, linguística, matemática, visual…) a que os conhecimentos em causa dizem respeito. No entanto, tendo em conta que (ainda) não temos nem os meios técnicos nem o conhecimento profundo do funcionamento do cérebro humano necessários para tornar esta visão possível, teremos sempre (ou melhor, por agora…) de recorrer a soluções um pouco mais convencionais (e um pouco mais deselegantes também, devo dizê-lo).

   Falo, portanto, da resolução de exercícios relativos aos conhecimentos leccionados. Tradicionalmente, isso seria feito sob a forma de testes, que, além de dizerem respeito a mais do que uma matéria (desvirtuando parcialmente o propósito de determinar se o aluno adquiriu um determinado conhecimento), acabam por não reflectir adequadamente, por motivos diversos (e como repito incessantemente, sempre que o possa fazer), aquilo que o aluno verdadeiramente sabe (falhando, então, inteiramente o pretenso propósito de avaliar o conhecimento do aluno).

   Assim, os testes não são a solução ideal. Aliás, incorrem, ainda, numa outra falha, que ainda não tinha apontado (e que me foi revelada por uma pessoa que espero que esteja a ler isto, e à qual não posso deixar de agradecer mais uma vez por essa ideia e pelo apoio…), e que é mais ou menos a seguinte: baralharem a existência com a recorrência dos erros. Permitam-me que me explique melhor. Ao efectuar um teste, enfim, acontece cometer-se, por vezes, certas estupidezes (por exemplo, estar tão embrenhado no processo de escrita que, inadvertidamente, se troca uma letra por outra, ou, no seguimento da frase, se esquece de um acento; ou, por outro lado, pela força do hábito, designar uma variável matemática por uma letra que não a que é indicada no enunciado…), que resultam não de um desconhecimento total ou parcial do assunto em causa, mas de uma distracção mais ou menos pontual; ora, penalizar os alunos por isto é injusto e, logo, indesejável. Admito que talvez seja difícil, em muitos casos, fazer a distinção entre o que foi um erro pontual e o que é prova de desconhecimento, mas não creio que essa incapacidade seja suficiente para justificar a penalização injusta dos que sabem…

   Então, depois disto tudo, poderiam ser levados a perguntar-me “Então e como raio é que se avalia?”; bom, mesmo não querendo ser repetitivo, creio que terei de descrever uma coisa bastante coincidente com os Mini-Ciclos de Leccionamento: à medida que se vai leccionando a matéria, os alunos vão fazendo exercícios e, quando passarem a realizá-los todos correctamente, consistentemente, deverão ter demonstrado, dentro do género, que adquiriram esse conhecimento. E, neste sentido, também os erros pontuais teriam um efeito mínimo, tendo em conta que se resolvem vários exercícios ao longo da(s) semana(s) em que a matéria é leccionada, pelo que esses erros, sendo pontuais, não ocorrerão em todos os casos. Creio, então, que fica respondida a primeira questão. Rimei, não?

   Pois bem, no que toca às consequências da avaliação, podemos dizer que, no actual sistema de ensino, são pouco mais que nulas. Sim, é verdade que, se um aluno tiver negativa nos testes e/ou exames, muito provavelmente chumbará (e o contrário também é válido). No entanto, isto em nada diz respeito ao conhecimento do aluno, porque qualquer um desses instrumentos engloba em si várias matérias, nem sempre todas encadeadas, e, por isso, o passar ou falhar essa avaliação não implica que, respectivamente, se tenha ou não se tenha adquirido os conhecimentos testados. Também nesse sentido, se um aluno chumbar, pode haver matérias que aprendeu e que é obrigado a “aprender” outra vez, ou, se passar, matérias que não aprendeu e que nunca mais irá aprender.

   Já devem ter percebido mais ou menos para onde é que eu vou levar isto outra vez, não é? Enfim, não o vou atrasar nem retardar, vou dizê-lo já: seria mais lógico se a matéria não viesse em “pacotes” de um ano, mas sim individualmente (matéria avulso, se assim quiserem), sendo cada matéria leccionada e avaliada em separado. Assim, caso um aluno não tivesse aprendido um dado conhecimento (ou seja, acabasse por não conseguir resolver acertadamente os exercícios com regularidade), poderia simplesmente (se assim o desejasse) voltar a frequentá-lo. E isto, meus caros, chama-se Mini-Ciclos de Leccionamento, como espero que por esta altura já saibam.
  
   Mas, ainda neste âmbito das consequências da avaliação, creio que também seria lógico implementar algum tipo de mecanismo segundo o qual uma grande quantidade de alunos a não conseguir adquirir uma dada matéria implicaria automaticamente algum tipo de averiguação no que toca aos motivos de tal acontecer e nas formas de se impedir que isso volte a ocorrer. Não falo exactamente de se penalizar a escola ou os professores, porque isso não resolve nada, agravando, até os problemas (os rankings são exemplo disso, levando a que escolas com piores resultados sejam menos financiadas, gerando uma degradação ainda maior das condições, o que só prejudica a aquisição de conhecimentos); falo, sim, de se tentar identificar os erros da organização e da pedagogia adoptadas e, se possível, corrigi-los. Mas pronto, isto são especificidades organizacionais de relevância reduzida, pelo menos, enquanto ainda não se implementou o novo sistema de ensino.

   Enfim. Relendo tudo isto que escrevi, creio que talvez tivesse sido mais simples pura e simplesmente escrever “Mini-Ciclos de Leccionamento!”, já que acabei por chegar (outra vez) à conclusão de que esse seria um sistema de ensino muito melhor do que o que o actual. Mas, como acabei por escrever este texto todo, considero que seria uma pena se o apagasse… Assim, e não obstante o teor vagamente repetitivo (e a relativa irrelevância) do texto, deixá-lo-ei ficar aqui, para que o leiam e (se quiserem) comentem. Um bom fim-de-semana a todos (e boas férias, para quem as tenha…).

12 de dezembro de 2015

Aferindo Aferições Diversas

   Antes de mais nada, tenho de apresentar as minhas desculpas por mais uma ausência, facto que, infelizmente, já se tornou um hábito. Eu gostaria, sinceramente gostaria, de escrever todos os dias, mas nem sempre consigo achar a inspiração necessária, ou um tema apropriado, ou argumentos minimamente válidos… e também me deparo, com a frequência a que o actual sistema de ensino já habituou os pobres daqueles que o frequentam, com todas essas ignobilidades de testes, e trabalhos, e trabalhos de casa… Enfim. Não interessa.

   Trago-vos hoje, com relativa frescura, uma temática que foi, se não estou equivocado, vagamente abordada na Assembleia da República recentemente, embora não exactamente pelas mesmas razões que me levam a abordá-la… Bom, em virtude da abolição dos exames do 4.º ano (Viva! Mas… e os outros? Não serão também para abolir? Não? Sou eu o único maluco que pensa assim?), e no âmbito de umas declarações do actual Primeiro-Ministro acerca disso, que estabelecia algum tipo de distinção entre a avaliação dos alunos e a aferição da escola, a bancada parlamentar do CDS-PP questionou o Ministro da Educação acerca da possível reimplementação das antigas (e parcialmente famigeradas) Provas de Aferição. E eu, como não poderia deixar de ser, vou aproveitar para criticar um pouco mais o actual sistema de ensino. Já sabem como sou, não é?

   Basicamente, a questão é: exames versus provas de aferição versus nada. Creio que se consegue mais ou menos adivinhar qual será a minha resposta, mas, mesmo correndo o risco de me tornar vagamente repetitivo, não me posso impedir de realizar uma análise crítica (e, mais do que isso, céptica) daquilo que são as provas de aferição. Dos exames, não vale a pena falar: remeter-vos-ei, em vez disso, para uma entrada anterior, onde me centro especificamente nessa questão. Aqui está.

   Bom, de uma maneira geral, as provas de aferição sofrem do mesmo tipo de problemas que os exames, testes e momentos formais de avaliação afins: não reflectirem adequadamente os níveis de conhecimento do aluno (já que constituem um momento pontual de avaliação, cujos resultados podem ser adulterados por uma vasta gama de factores, conforme não me canso de repetir), ajudarem a consolidar a noção de que o ensino deve actuar como elemento diferenciador de alunos (através das notas) e/ou corresponder a um mero cumprimento de requisitos mais ou menos burocráticos (leia-se programas), em detrimento da transmissão de conhecimentos que é, ou deveria ser, o verdadeiro propósito de qualquer sistema de ensino (conforme defendo na minha Fundamentação Metafísica do Propósito da Escola), e, de uma maneira geral, constituírem uma fonte de interpretações injustas e inadequadas à realidade, ao subjugar um conjunto de situações pedagógicas diversas a um mesmo critério geral, normalizado e normalizante, que, exactamente por ser assim, não tem em conta toda uma gama de possíveis situações adversas que escapam ao controlo dos alunos, penalizando-os injustamente (e, em parte, às escolas).

   Em suma, as provas de aferição constituem, ao fim e ao cabo, mais um momento de avaliação; mesmo que não seja esse o objectivo oficial das provas de aferição, não me parece improvável que, face ao eventual contributo das provas para os rankings das escolas (e, intrinsecamente, para o seu financiamento), elas sejam apresentadas aos alunos como algo de grande importância, para o qual se devem preparar afincadamente, conferindo-lhes, por isso, o mesmo tipo de efeitos psicológicos adversos que os exames (mesmo que os efeitos das provas nas notas sejam menores; ainda assim, afigura-se-me que haverá sempre aqueles casos em que um aluno entre a positiva e a negativa acaba por ser ajudado por ter tido mais ou menos boa nota nas provas de aferição, mas isso é outra história…).

   Nesse sentido, estaremos a trocar uma tortura prejudicial (exames) por uma tortura mais ou menos inócua (provas de aferição), mas uma tortura ainda assim. De qualquer das formas, entre os dois, tenho de concordar que as provas de aferição são a opção menos má. A questão é que a existência de provas de aferição deixa ainda em aberto a possibilidade da reimplementação dos exames nacionais, e isso é tudo menos desejável. Ah, claro, e também não posso deixar de frisar que as provas de aferição, não reflectindo o verdadeiro conhecimento dos alunos (como já disse e como continuarei a dizer), podem não ser um instrumento assim tão preciso para aferir a qualidade do ensino. Isto, claro, partindo do princípio que essa aferição da qualidade do ensino levaria, de facto, a algum tipo de mudanças, coisa que, pelo andar da carruagem, não me parece muito provável…

   Enfim. Mesmo que as provas de aferição sejam preferíveis aos exames, não são um bem, são apenas um mal menor. E eu não sou propriamente fã de males menores… acho, em vez disso, que não deve haver males nenhuns. Então, se me permitem que meta aqui a colherada habitual, parece-me que a solução mesmo, mesmo melhor seria não haver provas nem exames, e implementarmos, em vez disso, um novo paradigma de ensino: Mini-Ciclos de Leccionamento. Pronto. Já disse. Já se sabia que eu ia chegar aqui. Sou repetitivo, é certo, mas não posso deixar de tentar ao máximo promover esta perspectiva que, mais do que nova, creio ser melhor e, logo, mais desejável. Por isso, não me calarei e continuarei, sempre que puder, a apregoá-la o máximo possível.

   Para terminar, desejo um bom fim-de-semana a todos os meus leitores… ou um bom dia, ou seja o que for, já que poderão estar a ler isto não exactamente durante um fim-de-semana. Até à próxima, e não se esqueçam de que o espaço de comentários está aí em baixo, à espera do que possam ter para dizer…